segunda-feira, 17 de agosto de 2009

ENTREVISTA COM O TÉCNICO BERNARDINHO QUE SERVE DE EXEMPLO AOS TÉCNICOS DO BASQUETE BRASILEIROS

Pode parecer estranho que um blog que fala sobre basquete procure um treinador de vôlei para uma entrevista. Não quando este treinador é Bernardinho. Campeão olímpico, bicampeão mundial e com outro punhado de conquistas, o blog decidiu conversar com ele sobre temas que podem, sim, ser pertinentes a uma modalidade que pouco conhece palavras como “gestão”, “liderança”, “evolução”, “obsessão”, entre outras. Por isso, e sem maiores delongas, divirta-se com tanto conhecimento (Bernardinho não precisa de maiores apresentações, né?). Hoje vem a primeira parte. Amanhã, a segunda. As duas, eu garanto, imperdíveis.

BALA NA CESTA:Quando falam de você, algumas palavras costumam vir ao lado de seu nome: 'estrategista', 'planejado', 'gestor', 'justo', 'honesto', 'destemido', 'carismático', 'psicólogo' etc. Todas as suas características somadas formam o que os analistas chamam de “líder ideal do século XXI”. Como foi a construção daquele levantador Bernardinho até o comandante Bernardinho, reverenciado e aclamado nos dias de hoje?
BERNARDINHO: As características expostas acima certamente compõem o perfil de um grande líder, que antes de tudo deve buscar o aprimoramento permanente de suas capacidades. Não creio reunir todas essas qualidades, e creio ser um obsessivo na busca da evolução para minimizar tantas das minhas limitações. Creio que o processo de liderança é algo contínuo, onde busco ser justo nas tomadas de decisões, planejar as ações para que atinjamos nossos objetivos, tentar permanentemente entender as pessoas (atletas), para que possa tentar motivá-las e inspirá-las. Leio muito sobre pessoas que levam pessoas ao máximo de seu desempenho, observo e principalmente me questiono permanentemente, visando meu crescimento na função de gestor de equipes.

-- Há uma frase que você sempre cita do Michael Jordan que fala sobre “voltar aos fundamentos básicos”. Seus times, em geral, erram muito pouco. Como se dá este cuidado com os fundamentos no dia a dia, e como fazer com que ele (fundamento) não seja visto pelos atletas como algo supérfluo, algo que já sabem fazer sem maiores reparos?
-- Creio que a base de construção de qualquer profissional de sucesso, seja ele atleta ou não, seja o domínio e conhecimento profundo dos fundamentos que compõem e norteiam aquela atividade. Por isso nossa atenção permanente e quase paranóica com treinamento e na cobrança de execução precisa desses fundamentos. O exemplo Michael Jordan ao escolher a Universidade de North Carolina e o técnico Dean Smith é emblemático nesse sentido: ele queria se tornar um jogador completo, bom em todos os fundamentos (que defendesse e também arremessasse bem). Jordan não buscava a fama efêmera que numa escola onde fosse o grande cestinha ele poderia obter.

-- Nos seus dois livros (“Cartas a um jovem atleta”, “Transformando suor em ouro”, além dos comentários no do Michael Jordan “Nunca deixe de tentar”) há inúmeras referências a técnicos, líderes empresariais e jogadores de outras modalidades, sejam elas em filmes, livres, artigos ou revistas. Até que ponto essa sua face “devoradora de conteúdo” lhe é benéfica para comandar os atletas? Quanto de seu dia é gasto com leitura, você consegue mensurar?
-- Gosto muito de ler, principalmente biografias e relatos sobre equipes dos mais diversos esportes. Dependendo da fase, e principalmente em viagens, leio várias horas por dia. Acabei de ler The GM (Tom Callahan), que conta a história do ex-general manager do NY Giants responsável pelo recrutamento do atual quarterback (arremessador) da equipe Eli Manning, já campeão da NFL.

-- Você conseguiria citar os cinco livros que mais influenciaram a sua carreira como técnico?
-- Há vários e citarei alguns apenas alguns sem dizer que foram os mais importantes, mas de qualquer forma bem interessantes:
Bo's Lasting Lessons (a história de Bo Schembechler, técnico de futebol americano de Michigan), Beyond Basketball (Coach K), Finding a way to win (BillParcels), How life imitates chess (Gary Gasparov) e Everyone is a coach (Don Shula).

-- O basquete brasileiro vem aparecendo ultimamente nos noticiários mais pelas más campanhas que obtém do que pelos bons resultados. Muito de seu mau desempenho é atribuído à falta de capacidade dos técnicos, quase sempre desatualizados e sem voz de comando perante os atletas. Como reverter isso para transformar este círculo vicioso em um ciclo virtuoso?
-- É difícil analisar de fora as razões do sucesso ou fracasso de qualquer equipe, mas creio que dispomos de grandes treinadores, preparados, estudiosos. Muitas análises foram feitas e medidas estão sendo tomadas pelo que posso observar e pelo que a última Liga Nacional nos mostrou sob o aspecto de organização, planejamento e profissionalismo. Creio que o basquete retomou a estrada correta que o reconduzirá a um lugar de destaque no cenário internacional.

-- Talvez seja impossível não traçar uma comparação entre o caso do Ricardinho na seleção masculina de vôlei com o da Iziane na feminina de basquete. Como alguém, vendo de fora evidentemente, interpreta aquela atitude da atleta? Além disso, como você reage em casos de indisciplina como estes? O rigor da punição é sempre a melhor solução?
-- Não há soluções ideais. Há casos, momentos, reações, mas principalmente valores e princípios a serem respeitados evitando transgressões a todo custo. O time e os princípios fundamentais devem estar sempre acima de qualquer individualidade.
Autor: fábio balassiano

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